AVENTURA: OLHA A COOOBRAAAAAA!!!
…Não é mentiraaaaaa!
Junho é assim mesmo, aparecem as festas juninas, os hábitos do campo e as brincadeiras, quem não conhece aquela, a beira da fogueira: “olha a coooobraaaaa! é mentiraaaaa!”… pois, é, que não conhece ta perdendo…
Mas o “causo” que conto aqui não foi mentira, estava voltando de Santiago, Chile em outubro de 2002, usando minha Yamaha R1 e pra quebrar a monotonia e conhecer lugares novos, resolvi fazer outro caminho. O normal, que estava habituado a fazer é pela rodovia 7, direto até Buenos Aires, mas dessa vez resolvi subir por Córdoba, num caminho muito bonito, passando pelo “Desierto de Piedras”.
Calma! É apenas uma ilustração… fotografar a cena? Impossível. |
Segue o relato, manuscrito nas noites durante a viagem. Foi uma viagem de retorno, pra trazer de volta a moto que tinha ficado na casa de um amigo em Santiago durante o tempo em que eu me recuperava de um grave acidente de carro:
05/10/02 – Sábado… Havia chegado a Santiago na noite de sexta, de avião,
acordei cedo e fui a casa do Mário, meu amigo que
guardava a motoca… a encontrei do mesmo jeitinho que eu a tinha
deixado…. inclusive com as malas colocadas e cheia de roupas limpas
para a volta ! havia sim bastante poeira sobre a motoca… estava
preocupado com o funcionamento da moto, tanto tempo abandonada, mas foi
tranquilo…ela pegou rapidamente, graças a boa gasolina chilena ! eu tinha levado
comigo um pneu traseiro para trocar, pois o que estava na moto ja tinha
acabado… fui até uma concessionaria para trocar o pneu e na hora do almoço eu ja
estava pronto para subir a cordilheira… a subida foi feita com muita
calma… primeiro porque meu braço, apesar de estar sem gesso e com a
placa de metal, ainda não está plenamente calcificado… doe bastante e
requer cuidados, depois, porque ao ir para o Chile, tive que cruzar a
cordilheira em alta velocidade…perdendo todo encanto da paisagem ! dessa vez pra
compensar, a subida foi lenta, com várias paradas para tomar chocolate
quente e tirar fotos. Havia ainda bastante neve, resto do inverno !!!
estava linda !
Atravessei o túnel Cristo Redentor, passei pelas alfandegas e parei no
primeiro vilarejo..ainda no topo da cordilheira – Puente del Inca – ali
dormi ! Fazia frio, no hotel disseram que estava -4 graus a noite !
todas as poças de água congelaram a noite…indicando que eu deveria tomar
cuidado extra na manha do dia seguinte, para seguir viagem.
A R1 subindo a cordilheira, “Los Caracoles” com bastante neve em outubro! |
06/10/02 – Domingo… dia maravilhoso, sol e céu de brigadeiro !!!
vontade de rodar, mas ao mesmo tempo, vontade de eternizar aquele momento na
cordilheira… sai para uma caminhada e fui até as ruínas do hotel que
ali existia, destruído por uma avalanche ! fiquei imaginando como teria
sido aquilo, olhei para o topo das montanhas que o cercam e vi ainda pedras
soltas…uma espécie de rastro de destruição… pra quem acredita é um
milagre o que para os incrédulos não passa de coincidência. Seja como
for, o fato é que uma capela resistiu a avalanche, tudo em volta dela foi
destruído, exceto a igrejinha ! Pedi ali a Deus um pouco mais de
proteção, pois ainda faltavam mais de 4.000 km até minha casa ! Comecei a
descer a cordilheira, num ritmo ainda mais lento, meu destino era Mendoza, ali
pertinho, a menos de 300 km, mas no fundo do coração, eu não queria
abandonar aquele paraíso. A cordilheira é tão grande, que te faz, sobre a
moto, se sentir minúsculo ! isso gera reflexão, é muito bom !!! as curvas
são deliciosas, mas não dá pra prestar muita atenção na pilotagem,
tendo aquele cenário maravilhoso como pano de fundo…fotos e mais fotos, um
rolo de filme se foi ali ! Cheguei a Mendoza a tarde, a cidade está linda
(pra mim esta é a cidade mais bonita da Argentina), fui ao centro, ciber
café para contatar os amigos, almocei..passeei pela cidade, uma delicia !
Contemplando as maravilhas da natureza! |
O lado argentino da Cordilheira, da pra ver a estrada, um risco escuro do lado esquerdo do vale. |
A entrada do tunel Cristo Redentor com muita neve ainda. |
07/10/02 – Segunda Feira – O destino era Córdoba, cerca de 700 kms de
Mendoza ! segui viagem, atravessando o deserto, paisagem monótona
perto do que tinha visto no dia anterior, mas tem seu encanto também ! Depois
de San Luis troco a Ruta 7 pela Ruta 20 e rumo para Villa Dolores. Ali, já
próximo a Córdoba, pode-se ver uma enorme serra, de 2.200 metros de altitude
que situa em seu cume a cidade de Córdoba ! é linda, toda formada em
pedras, recebe nome coerente “Desierto de Piedras“. Subir a serra depois de
andar pelo deserto foi delicioso. O dia seguia maravilhoso e a temperatura
quente do deserto aos poucos era trocada pelo ar fresco da serra ! Curvas
muito gostosas e paisagens deslumbrantes. Resolvi parar no acostamento e
tentei dormir sobre as grandes pedras… não consegui dormir, mas passei ali
algumas horas refletindo, observando minha companheira, a R1, e vendo a
paisagem que me cercava ! parecia um sonho ! Antes de Cordoba, ha 35
km, existe uma cidade serrana, tipica de veraneio, que se chama Carlos
Paz, foi indicação de um amigo, o Aleixo, dormir ali… e assim foi feito. A
cidade é um encanto ! um belo lago garantiu um por do sol inesquecível !!
Desierto de Piedras |
08/10/02 – Terça Feira – A ideia era passar a terça feira na cidade e
fazer algum tour por ali, entretanto era baixa temporada e as agencias de
turismo não tinham nada a oferecer. Amanheceu chovendo forte ! Eu, com
saudades de andar de moto e me sentindo atraído pela chuva (na qual adoro pilotar),
arrumei minhas malas e segui viagem ! Fato curioso marcou esse dia de
viagem por uma região que não é das mais bonitas da argentina. – agora a parte da cobra:
Ainda próximo a Córdoba, num dos únicos instantes que a chuva havia dado uma trégua,
Ainda próximo a Córdoba, num dos únicos instantes que a chuva havia dado uma trégua,
vi no centro da pista bem no rumo do pneu da R1, uma ave média (penso ser um
gavião, não entendo nada de aves, mas urubu não era). Como já é regra de
não desviar, para evitar estar desviando para o mesmo lado da ave, fiquei na minha,
mantive a trajetória e segui em frente !
não desviar, para evitar estar desviando para o mesmo lado da ave, fiquei na minha,
mantive a trajetória e segui em frente !
Eis que, como é esperado, a ave alçou voo ! e como planejado, livrando a
trajetória para que eu passasse, mas para minha surpresa, em
seu bico ela tinha uma pequena cobra, que se contorcia toda, parecendo estar bem
desconfortável com o voo ! Segundos depois, a ave, não suportando o peso ou a movimentação de protesto da pequena cobra, simplesmente soltou-a …. em minha direção !!!
felizmente foi tudo muito rápido, confesso que não tive tempo de sentir medo..
a cobra caiu bem na frente da moto e imediatamente atropelei-a, ainda que sem reação
felizmente foi tudo muito rápido, confesso que não tive tempo de sentir medo..
a cobra caiu bem na frente da moto e imediatamente atropelei-a, ainda que sem reação
alguma, apenas mantendo a trajetória ! ah depois de passado o susto é que
veio a tremedeira !! risos….não cheguei a parar a moto, mas fiquei
assustado por uns bons quilômetros ! Cheguei no final da tarde a Uruguaiana, depois
de 900 km de chuva (naquela noite haviam registrado o record de chuva
naquela cidade em 2002, não me lembro o numero em mm, mas era elevadíssimo !)
A chuva persistiu pela noite toda ! Achei um hotel excelente naquela
cidade, recomendo a quem passar por ali (Bom Bonito e Barato)…fica, assim
que se cruza a ponte sentido Argentina – Brasil, na primeira rua a direita,
primeiro hotel a direita !… garagem boa e conforto de sobra !
Roteiro Santiago a São Paulo, via Córdoba e Uruguaiana |
09/10/02 – Quarta Feira – Segui para Porto Alegre, onde os amigos “Beto
Cagiva” e Álvaro Teixeira (in memorian) me aguardavam… aproveitei e mandei
balancear a roda traseira da moto, que havia recebido pneu novo em Santiago e
sofria pela falta de balanceamento ! Jantamos na Duaction, onde tive o prazer
de conhecer Ron Ayres, un “ironbutter” consagrado nos USA.
10/10/02 – Quinta Feira – Passei o dia em PoA com os amigos. Combinei
com o Chardô para subirmos juntos até Tubarão, meu próximo destino, tendo em
vista que ele seguia na manha de sexta feira até Florianópolis.
11/10/02 – Sexta Feira – Amanheceu um dia nublado, porém sem a chuva
dos outros dias… Encontrei Chardô no posto de gasolina e seguimos até
Tubarão, onde nos despedimos e ele rumou para Floripa !
12/10/02 – Sábado – Adilson, um amigo de Joinville, ofereceu um
churrasco para meu retorno ao Brasil… Fiquei muito feliz ! Na manha de
sábado, sai bem cedinho de Tubarão e rumei a Joinville… ali já no portal já
podia ver o movimento de motos, talvez umas 20 ou 30… vários amigos, de todo
lado (Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, São Paulo e etc) foram ao
Churrasco ! Estava uma delicia e foi muito bom encontrar a todos ali !
13/10/02 – Os amigos de São Paulo que tinham ido ao Churrasco subiram
comigo até São Paulo, Aleixo com a ZX-9r, Guilherme e Flavia com a GSX1100,
Pedro e Tadeu com suas GS1150… Subimos pela serrinha que liga Jaraguá do
Sul a BR116, viagem tranquila ! depois, pegamos a Regis Bittencourt e
Seguimos para SP. Cheguei a Atibaia as 20:00 h, o odômetro parcial da R1
Marcava exatos 4.300 km rodados. Cansado, claro, mas o sorriso enorme no
rosto não escondia a minha alegria !!
Essa é uma viagem simples, curta, mas que teve um sabor muito especial por duas razoes:
1) em maio do mesmo ano, havia ido a Santiago disposto a quebrar um record mundial de travessia do continente sul americano sobre uma motocicleta, o chamado “Latin America 30cc Gold“, no qual o desafiante deveria cruzar o continente sul americano, de oceano a oceano, em menos de 30 horas, com a condição de cruzar ao menos 4 países. Assim foi feito, consegui fazer em 26 horas inesquecíveis!
2) a moto ficou em Santiago, fiz o “Coast to Coast” em um feriado e era previsto deixa-la lá (na casa do Mário, um amigo) e buscar 40 dias depois, em outro feriado. Mas o destino não quis assim, e 10 dias apos o Coast to Coast, sofri um grave acidente de carro, ficando por mais de 1 mês internado entre a vida e a morte (depois mais 3 anos sofrendo cirurgias diversas pra organizar a quebradeira). Ai, veio o inverno, era junho, eu já havia saído do hospital, mas com o inverno e ainda em recuperação não havia como buscar a R1, apenas em outubro isso foi possível – e por isso a viagem foi feita com tanto cuidado, tanto romantismo, aproveitando cada segundo, cada respirada de ar puro por um pulmão que sofrera embolia meses atras…
Saindo de Rio Grande, RS – momento inicial do desafio “Coast to Coast 30” (Latin America 30CC Gold) |
Roteiro de ida – Coast to Coast 30 (Latin America 30CC Gold) |
26 horas depois, em Viña del Mar |
A pancada com a Ranger – motor parou dentro da cabine, longarinas quebraram ao meio! |
Aos 51 anos, Diego completa 38 intensos anos de motociclismo! Colecionador detalhista e aficionado por motos clássicas, principalmente as dos anos 1980. Ultrapassando a marca do 1.000.000 de km rodados – Seja como piloto de testes da revista Duas Rodas, aventurando-se pelo mundo em viagens épicas e solitárias em motos super-esportivas ou quebrando recordes de distancia e resistência sobre a motocicleta onde conquistou 18 certificados internacionais “IronButt”.